
É uma pausa por uma boa causa: amanhã pelas nove da manhã (quando forem dez da noite de quarta-feira em Lisboa), estarei a colocar a minha bagagem na carrinha que me vai levar até perto de Te Anau, junto à Costa Oeste da Nova Zelândia, de onde parto para o Milford Track, descrito por qualquer guia da especialidade como um dos 'dez mais bonitos' passeios cénicos (o que quer que isso seja) do Mundo, que tem o seu culminar no Milford Sound, um desfiladeiro de beleza épica, definido por Ruyard Kipling como a oitava maravilha do mundo conhecido.
Não sei se é um dos dez mais, dos vinte ou dos cem, nem me lembro das restantes sete maravilhas a que o escritor inglês se referia, e sinceramente depois de ter sobrevivido a quatro dias sem banho e WC nos Andes, entre os dois e os quatro mil metros de altitude, para ver Macchu Pichu ao amanhecer, também já não sinto que precise de ganhar qualquer tipo de galões a percorrer quilómetros de botas calçadas.
O que sei, e o que em deixa descansado, é que qualquer neozelandês a quem eu digo que vou fazer o Milford Track me dá imediata aprovação e encorajamento. Também sei que não há nada como uns dias efectivamente afastado dos confortos da civilização — embora a experiência do Perú me tenha feito ver que vai compensar o investimento extra que fiz desta vez, num quarto, retrete e duche privativos — para, como dizem os ingleses, pôr as coisas in perspective, aproximando-nos da natureza e lembrando-nos que é dela que fazemos parte, e não do aglomerado de vidro, cimento e stress em que vivemos a maioria do tempo.
Estive hoje a ver o DVD com preview (sorry, Pacheco) do que vai ser a viagem e tenho a sensação que não sairei, mesmo que o tempo não ajude (e a chuva é bastante provável nesta altura e no caminho que vou fazer), defraudado com esta aposta.
Vou tirar com toda a certeza muitas fotografias, e no segundo e terceiro dias, os mais exigentes, adormecerei com o cansaço antes do gerador ser desligado, às dez da noite. O portátil ficará no depósito de bagagens do hotel, substituído pelo livro de notas Moleskine e pela caneta. Levarei o mínimo necessário, porque em mais de cinquenta quilómetros de caminhada cada cem gramas supérfluos na mochila sentem-se nas costas. O telemóvel só irá comigo porque preciso de despertador e não tenho outro, mas mesmo que houvesse rede passaria sempre o dia desligado.
Até segunda-feira (Domingo à noite em Lisboa) vou estar na parte da viagem que tinha planeado para não haver escapatória. Quer queira, quer não, durante a maioria dos próximos cinco dias vou estar longe do mundo. É a única maneira de verdadeiramente escapar: estar num sitio onde o táxi mais próximo está a dois dias de caminho. Num dia normal ficaria preocupado por não haver táxis. Desta vez, confesso, estou tudo menos preocupado com isso.
1 comentário:
Meu caro... e escrever...outras coisas, não??
Um forte abraço,
pf.
Enviar um comentário