
Foi um sentimento estranho, sentir um tipo de nostalgia que em trinta e cinco anos de vida só tinha sentido numa circunstância: quando regressava a Lisboa depois de uma ausência minimamente prolongada.
Percorri os espaços onde passei uma infância feliz: o Pátio da Penha, no fundo do qual estava o 'Edifício Bilionário', recém-inaugurado quando para lá me mudei, nos primeiros dias do ano de 1980, o parque infantil junto ao Palácio do Governador onde celebrei, no meio de muita animação, sumo de laranja e pãezinhos de leite, o meu oitavo aniversário, a ermida da Penha, que regularmente assaltávamos para fazer guerras de pressão de ar.
O que mais estranhei foi a escala: tudo parece maior quando se tem um metro e quarenta, é um facto, pelo que tudo me pareceu estranhamente mais pequeno nesta visita. Também me surpreeendi com as partidas que a máquina de memória associativa que é o nosso cérebro nos prega: passei pela moradia onde vivia a família Trindade e lembrei-me, vá-se lá perceber porquê, que foi aqui que pela primeira vez de ouvir falar de Eça de Queirós, e d'Os Maias.
Macau está radicalmente diferente, transformada por vinte e oito casinos onde apenas existia um, por aterros que lhe acrescentaram oito quilómetros quadrados à superfície da península, por arranha-céus, estádios, casinos e uma faixa de terra entre Taipa e Coloane, onde antes apenas existia uma pista de corridas de galgos, um campo de refugiados vietnamitas, uma pousada e meia dúzia de barracas.
Não me reconheci nesta Macau de cara mudada, na linha do horizonte que o tempo, o progresso e o regresso à soberania chinesa alteraram por completo. Mas não pude deixar de me sentir em casa ao andar pelas ruas sujas do Porto Interior, ou pelas vielas estreitas que levam da Baía e do templo de A-Ma até ao cimo da Penha

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