
Segundo a explicação mais popular, e também mais próxima do mito do que do facto histórico, a cidade deve o seu nome a um garimpeiro que, durante a febre do ouro de que este local foi palco, na década de 60 do Século XIX, exclamou que o local estava à altura da Rainha Vitória. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, e Queenstown é uma cidade onde ficamos com a impressão que por pouco não anda toda a gente descalça.
Tirando provavelmente os residentes — dez mil habitantes, segundo as estatísticas, que a julgar pelo movimento e pela quantidade de carros estacionados serão uma pequena parte do total de pessoas que por aqui andam — fico com a sensação de ter aterrado numa praia da Ericeira em dia de campeonato do Mundo de Surf, ou numa tenda de chás medicinais do Boom Festival.
Não é uma queixa, até porque em meia dúzia de horas vi mais miúdas bonitas com ar arejado (de quem apesar de tudo tomou banho esta semana) do que somando os dias anteriores na Ilha Sul, mas a verdade é que a cidade transpira frescura e descontracção, ao ponto do grupo que se sentou ao meu lado para beber uma cerveja enquanto eu almoçava ter amarrado a coleira do cão (a la cavalo do velho Oeste) a uma espécie de corrimão na esplanada do restaurante, enquanto os meus vizinhos do lado oposto se entretinham a alimentar os pássaros que andavam tranquilamente... em cima da mesa.
Mesmo os japoneses, esses meus velhos conhecidos (acredite-se ou não, ao fazer o check in encontrei logo um grupo de nipónicos de meia idade, instalado nos sofás do hall da recepção, a receber instruções do seu guia) andam de calções e bastão de caminhada na mão, porque se não se integram no movimento radical que parece assaltar a cidade — deve ser o sítio do Mundo com maior oferta de shots de adrenalina por metro quadrado, do bungee jumping à queda livre, passando pelo parapente, rafting ou jet boating, para além de inúmeras estâncias de ski — até eles se sentiriam deslocados se para aqui viessem passear as máquinas fotográficas.
Recuperado o trauma de ver sexagenários japoneses de calções, mochila e botas de trekking (uma estreia absoluta, mesmo para um viajante calejado como eu), depois do almoço dei um primeiro passeio pela cidade, e apanhei o teleférico que dá uma vista panorâmica sobre o Lago Wakatipu, que com 290 Km2 tem quase quatro vezes a área de Lisboa, e sobre os Remarkables, um conjunto de montanhas próximo, cujo pico mais alto, o Double Cone, atinge os 2340 m.
Hoje foi um dia que decidi dedicar a uma tarefa fundamental e substantiva, que como todas as tarefas substantivas demorará tempo, pelo que a adiei até ao limite do possível: arrumar a minha mala, separar a roupa para os meus dias de Trekking e organizar o que preciso até à ida para Auckland.
Tenho passado o dia estranhamente mole e adormecido (parei, inclusivamente, para dormir meia horita à vinda de Mount Cook para aqui), e o tempo persistentemente chuvoso deve ter algo a ver com esta vontade insistente de me deitar a ver televisão e dormir uma sesta, a que até agora consegui resistir.
No entanto, e dado que amanhã se prevê o regresso do Sol, vou aproveitar para arrumar a mala, usar a ligação à internet do quarto, experimentar a paella de marisco (estou curioso, até porque ainda não comi mal em território neozelandês) que o restaurante do Hotel me propõe, atacar mais um pouco dos dois óptimos livros que estou a ler e, em suma, recuperar forças, um imperativo se pensarmos que depois de amanhã a esta hora já estou no primeiro lodge do Milford Track.
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