terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Tranquilidade, na Terra e no Céu

Hoje de manhã, ao acordar de um sono retemperador — depois de contrariar duas vezes o meu organismo, que se queria levantar às sete e meia e às oito e meia da manhã, apesar de me ter deitado pelas quatro — fui premiado com uma supresa: um Céu imaculado e um Sol radioso, como já não via praticamente desde que saí de Kaikoura. Depois de ter tido provavelmente os três ou quatro dias mais molhados da minha vida, esta terça-feira não podia ter começado melhor.

Dirigi-me, revista em punho, carteira e iPod no bolso, para o lago, onde escolhi uma das agradáveis esplanadas para almoçar, um delicioso salmão acompanhado de uma tempura de bróculos à maneira tailandesa, com sementes de sésamo a fazer a vez do polme na cobertura dos vegetais. Após o almoço dirigi-me a uma chocolateria artesanal próxima, onde escolhi como sobremesa um óptimo gelado de chocolate negro, entregando-me de seguida, como já não fazia desde o The Pier, em Kaikoura, à mais pura inactividade, deitando-me na relva fresca durante um bom período, intercalando a leitura com a simples exposição ao Sol, ao som da música do meu iPod, abrindo de vez em quando os olhos para disfrutar da belíssima paisagem, reparando com agrado como toda a gente em meu redor parecia partilhar o meu ritmo.

Mesmo para quem não costuma ou gosta de estar parado, como é o meu caso, são estes momentos que nos fazem apreciar o privilégio de estar de férias, sem precisar de actividade para nos sentirmos úteis ou vivos. Ao vigésimo segundo dia de ausência de Lisboa, e uma semana depois de ter chegado a Queenstown, não me custou nada parar um pouco.

Por melhor que me estivesse a saber a inércia, sabia que não podia ficar assim o dia todo, sob pena do descanso passar a monotonia, coisa que detesto. Precisava assim uma actividade que eliminasse qualquer hipótese deste ser um dia igual aos outros. Enquanto estava deitado na relva surgiu-me a solução, ao olhar para os montes sobranceiros a Queenstown, ligados à cidade pelo teleférico. Dirigi-me à estação ao nível do solo, apanhei uma cabine até ao cimo, descobri o quiosque adequado ao que pretendia, e cinco minutos depois estava a voar sobre a cidade e sobre o Lago Wakatipu, pés suspensos a várias centenas de metros de altitude, com o ruído vento como único companheiro, a minha vida dependente da experiência do piloto do parapente (lembrei-me deste detalhe nos breves momentos em que ele deixou que eu próprio pilotasse a asa).

A experiência é uma combinação única de paz e adrenalina: paz quando planamos no céu, a grande altitude, mesmo quando pouco abaixo estão as copas das árvores, e adrenalina no minuto final, quando a asa se precipita, rodopiando a alta velocidade, para o local de aterragem, até darmos o sinal que preferimos voltar ao ritmo tranquilo que tínhamos experimentado nas alturas.

Aquilo que senti quando aterrei em terra firme, e a adrenalina voltou a descer, foi a satisfação de ter obtido exactamente o que procurava quando decidi subir ao monte: longe de arriscar a caír monotonia, o resto do meu dia, foi passado a disfrutar, noutra esplanada a ler e beber cerveja, uma tranquilidade caída do céu.

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